A reforma trabalhista introduziu a regulamentação legal da prescrição intercorrente, até então inexistente na CLT. A partir da reforma, está definido o que, antes, era fonte de dúvidas e controvérsias, ou seja: o momento em que se reinicia a contagem da prescrição, dando causa à suspensão ou à extinção da execução trabalhista.

Ficou estabelecido no artigo 11-A da CLT que a prescrição intercorrente ocorre no processo do trabalho no prazo de dois anos, contado a partir do momento em que o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução, além da previsão de que a declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição.

Em julho, entretanto, a Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho editou a Recomendação 3/CGJT, por meio da qual recomenda aos juízes e desembargadores do trabalho a observância de procedimentos prévios à efetiva decretação da prescrição, que não estão previstos na lei.

Segundo o texto, antes do reconhecimento da prescrição deverá o magistrado: (i) intimar as partes novamente para que se manifestem, indicando, com precisão, qual determinação deve ser cumprida pelo exequente, com expressa cominação das consequências do descumprimento, e (ii) promover, de ofício, todos os meios possíveis para satisfação da dívida, inclusive por meio de Bacenjud, Infojud, Renajud ou Simba e desconsideração da personalidade jurídica da sociedade executada.

Além disso, o ato estabelece que o prazo prescricional não iniciará nas hipóteses em que não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, devendo o juiz, nesses casos, suspender o processo ou arquivá-lo provisoriamente, com a possibilidade de desarquivamento e prosseguimento da execução a qualquer momento.

A edição do texto se fez sob a consideração da necessidade de “uniformizar os procedimentos adotados pelos magistrados do trabalho no que se refere à condução das execuções trabalhistas, levando em conta a ausência de previsão nesse sentido para o reconhecimento da prescrição intercorrente”.

A despeito, porém, da motivação sobre suposta lacuna legal, destaca-se que, em verdade, a legislação é completa e satisfatória quanto ao ponto. Veja-se.

A CLT é expressa ao prever que se aplicam aos trâmites e incidentes do processo da execução os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da fazenda pública (artigo 889, CLT). Essa disposição foi inclusive referida pelo novo ato normativo, ao mencionar “a necessidade de harmonização do texto consolidado com outros dispositivos legais aplicáveis ao Processo do Trabalho, como o artigo 40 da Lei n.º 6.830/80 e o artigo 921 do Código de Processo Civil”.

De fato, a Lei de Execuções Fiscais (LEF), no tocante ao tema da prescrição intercorrente, contém disciplina clara e adequada quanto aos procedimentos a serem adotados na matéria, o que desaconselha a edição de regras procedimentais novas e distintas por ato de natureza simplesmente administrativa, como é o caso da Recomendação CGJT 3/2018.

Prescreve o artigo 40 da LEF o seguinte: (i) quando não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, o juiz deve suspender o curso da execução, oportunidade em que não correrá o prazo prescricional; (ii) decorrido o prazo máximo de um ano da suspensão sem que sejam encontrados o devedor ou bens penhoráveis, o juízo deverá ordenar o arquivamento do processo; (iii) se da decisão que ordenar o arquivamento decorrer o prazo prescricional, o juiz, após ouvir a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.

Logo, as disposições previstas no artigo 40 da Lei 6.830/80 devem ser aplicadas à execução trabalhista, pois não se contrapõem às demais regras legais da execução contidas na CLT, ficando claro que não há, no caso, vazio legislativo que justifique a atuação normativa de órgão do Poder Judiciário para fins de uniformização de entendimentos ou da criação de procedimentos distintos.

Da mesma forma, o artigo 921 do CPC, também aplicável subsidiariamente ao processo trabalhista, estabelece disciplina correta e atualizada ao problema das execuções judiciais que são frequentemente paralisadas, dispondo sobre regras até similares àquelas do Lei de Execuções Fiscais.

Portanto, tem-se que a recomendação recém-editada pela Corregedoria Nacional trabalhista acaba por criar obstáculos não previstos na CLT e nas regras legais de aplicação subsidiária ao processo do trabalho, o que faz parecer que, na verdade, há alguma persistência no seio do TST para que seja mantido, a despeito da nova regulação introduzida na CLT, o entendimento da sua antiga Súmula 114, ao proclamar que o instituto da prescrição intercorrente seria inaplicável na Justiça do Trabalho.

A grande questão é que, embora o ato normativo afirme a natureza de mera “recomendação”, fica clara ao longo do texto a imposição de um dever a ser cumprido pelos juízes e relatores, sendo reiteradamente utilizado o termo “deverá”. E, assim agindo, o tribunal está a exceder suas competências, além de invadir aquelas constitucionalmente atribuídas ao Poder Legislativo.

Ainda mais grave do que o problema formal são as consequências práticas. Isto porque tais procedimentos obstam (ou mesmo inviabilizam) a eficácia do instituto da prescrição intercorrente, o que vai de encontro ao interesse público por celeridade processual e pela diminuição do volume extremamente agigantado de processos pendentes na Justiça do Trabalho. Tal não bastasse, tais procedimentos protegem de forma não razoável e injustificada aqueles que nitidamente desrespeitaram o princípio da cooperação processual ao permanecem inertes, o que incentiva a cultura da protelação do feito.

Por fim, cabe notar também que, ao determinar a adoção de ofício pelo juiz de todos os meios possíveis para satisfação da dívida, a recomendação afronta a expressa previsão legal do artigo 878 da CLT de que incumbe tão somente às partes o dever de promover a execução, “permitida a execução de ofício pelo juiz ou pelo Presidente do Tribunal apenas nos casos em que as partes não estiverem representadas por advogado”.

O que se vislumbra, diante do cenário acima narrado, é uma certa demonstração de resistência contra o tratamento legal da prescrição estabelecido pela reforma trabalhista, o que poderá contribuir para a insegurança jurídica e concorrer para a eternização dos litígios.

Fonte: ConJur